Cultura

Dois livros: Os Russos e Um diário russo

February 13, 2017

Vamos tirar a poeira desse blog? Vaaaamos! Bom, continuo a minha jornada de leituras relacionadas à Ucrânia e de imersão na cultura eslava. No final do ano passado, li o livro do autor Angelo Segrillo sobre os russos. A Editora Contexto tem uma coleção dedicada a vários povos e, como não há um livro específico sobre os ucranianos, li esse sobre os russos que inevitavelmente fala um pouco sobre a Ucrânia, já que toda a história começou aqui em Kiev. Angelo Segrillo é professor de História Contemporânea na USP e especialista em Rússia e URSS. Ele morou e estudou na Rússia e escreveu diversos livros sobre o país. Esse livro é bem legal para o leitor ter uma ideia geral sobre a cultura, a história, a geografia e os costumes russos, alguns deles compartilhados pelos ucranianos.

Gostei bastante do livro e ele me ajudou a entender melhor a história, toda a questão da Revolução Russa, o período da União Soviética e o fim da União Soviética até a chegada do Putin ao poder. O autor explica de forma clara, fácil e resumida e dá pra entender direitinho toda a sequência de acontecimentos que era muito fragmentada na minha cabeça. Todas essas informações ajudam bastante a entender a literatura russa, pois sabemos que a arte sempre reflete algo sobre a época em que foi criada. Inclusive, o autor cita várias obras e faz essa ligação, tornando a leitura muito interessante e leve. Com certeza ficarei consultando esse livro de tempos em tempos.

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O livro é recheado de fotos como essa do Trótski que eu não sabia que tinha nascido na Ucrânia. A única coisa que eu lembrava sobre o Trotski é que ele teve um caso com a Frida Kahlo durante o período do exílio no México. A revolução russa aconteceu em 1917, ou seja, esse ano é o centenário da revolução e é uma boa oportunidade para ler sobre o tema.

Em seguida, li “Um diário russo”, que é um relato da visita que o escritor e jornalista John Steinbeck e o fotógrafo Robert Capa fizeram à União Soviética em 1947. Gostei demais desse livro, li rapidinho. É meio como estar lendo um blog de viagem, como se você estivesse viajando junto com eles. Os capítulos 4 e 5 se passam na Ucrânia e dá pra ter uma boa ideia de como estava Kiev dois anos após o fim da Segunda Guerra Mundial. O clima era de esperança e reconstrução e todos estavam bem felizes com o fim da guerra.

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“As pessoas aqui haviam sido extremamente hospitaleiras, atenciosas e generosas – e havíamos gostado muito delas. Era uma gente inteligente e risonha, com senso de humor, uma gente animada. Em meio às ruínas de seu país, os ucranianos estavam empenhados em construir novas residências, fábricas, máquinas e uma nova vida. E sempre nos diziam: ‘Voltem daqui a alguns anos para ver o que temos realizado’.”

Foi bem legal descobrir que a impressão de John Steinbeck sobre os ucranianos é absurdamente parecida com a minha e já comentei sobre isso aqui no blog. O trecho a seguir ilustra bem isso: “Embora Kiev tenha sofrido uma grande devastação, o que não ocorreu em Moscou, os moradores da cidade não têm a aparência de profunda fadiga que se nota nos moscovitas. Não se arrastavam ao caminhar nem tinham os ombros curvados, e além disso, riam nas ruas. Claro que isso pode ser apenas um traço local, pois os ucranianos são diferentes dos russos, constituindo uma espécie à parte de eslavos.”

No mesmo parágrafo ele comenta sobre a língua: “E, ainda que a maioria dos ucranianos saiba falar e ler russo, eles dispõem de uma língua própria, mais próxima das línguas eslavas meridionais do que do russo. Muitos termos ucranianos, sobretudo os relativos à agricultura, assemelham-se a palavras húngaras, enquanto outros são encontrados também no tcheco, mas não no russo.” Já escrevi sobre o meu aprendizado da língua ucraniana e fica cada vez mais claro o quanto ela é diferente da língua russa e adorei ler sobre isso nesse relato.

John Steinbeck tem uma escrita deliciosa e bem humorada e eu morria de rir a cada comentário dele sobre o Capa e seus hábitos. Me identifiquei muito com o fotógrafo que ficava mal humorado por não conseguir fazer as fotos que queria e a eterna insatisfação com as próprias fotos que acho que é comum a todos os fotógrafos. Bom, para finalizar, uma última citação com a qual me identifiquei demais, pois passei por essa mesma experiência antes de me mudar para cá: “Quando as pessoas ficaram sabendo que estávamos de partida para a União Soviética, fomos bombardeados com conselhos, advertências e alertas, a maioria deles, é preciso dizer, de gente que jamais estivera naquele país.” É só trocar União Soviética por Ucrânia que seria facilmente eu escrevendo…

Alguém aí conhece esses livros? Em breve falarei sobre outro livro lido em janeiro que tem tudo a ver com a Ucrânia, aguardem.

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  • Katarina Holanda February 14, 2017 at 5:51 pm

    Um Diário Russo é mesmo muito gostoso de ler, to pra resenhar no blog há um tempão, haha. O primeiro eu não conhecia, obrigada pela dica! 🙂

    • Alessandra Araújo February 16, 2017 at 7:41 pm

      Por nada! Em 2015 eu li o livro do Capa, “Ligeiramente fora de foco” que é ótimo também. Ele devia ser um cara muito interessante.

  • Evana February 15, 2017 at 1:04 pm

    “Os Russos” está na minha lista de leituras para esse ano. 🙂 O outro eu não conhecia, mas vou tentar ler em breve. Obrigada pela dica!

  • Bárbara Hernandes February 16, 2017 at 8:44 pm

    Cara, adoro isso de você querer imergir na cultura mesmo, saber mais da história, arte e cultura do país onde você mora. Acho isso muito legal, respeitoso, digno mesmo, sabe? Eu tento sempre visitar museus e ler sobre a história da Irlanda também, acho que é o mínimo que podemos fazer em troca da oportunidade de vivermos nesses países, não é?

    • Alessandra Araújo February 20, 2017 at 1:43 pm

      Eu gosto muito de aprender coisas novas, Bárbara. E acho que esse é o melhor momento da minha vida para aprender mais sobre esse de lado de cá da Europa que ficou escondido do mundo ocidental por tanto tempo. Estou aproveitando tudo que posso.

  • Izzy February 20, 2017 at 12:34 am

    Trotski teve um caso com a Frida Kahlo? Caramba, eu nem fazia ideia disso (e cá estou eu a declarar minha ignorância publicamente). O seu blog é foda mesmo, com o perdão da palavra. A gente sempre aprende algo quando passa por aqui. 🙂

    Eu não conheço esses livros e me interessei pelos dois. A lista de espera só aumenta, tanta coisa legal para ler.

    • Alessandra Araújo February 20, 2017 at 1:50 pm

      Pois é menina, babado neh! Eu sabia disso por conta do filme sobre a Frida e confesso que só fui me interessar por ela após assistí-lo há uns bons anos. Caso não tenha assistido ainda, fica a minha dica.

  • Vozes de Tchernóbil – Svetlana Aleksiévitch – Um Novo Destino February 21, 2017 at 3:42 pm

    […] John Steinbeck e Robert Capa visitaram a União Soviética em 1947, foram questionados várias vezes se os EUA lançariam uma bomba lá como fizeram no Japão. Foi […]

  • FERNANDA SANTOS DOURADO February 22, 2017 at 8:03 pm

    Só depois de ler “os russos”
    q consegui vislumbrar a complexidade dos acontecimentos pós revolução de 17 até os dias de hj. Uma maçaroca danada!
    Off tópic: viu La La Land?

    • Alessandra Araújo February 27, 2017 at 5:18 pm

      Sim, eu também tinha pouquíssima informação sobre toda a história da Rússia e esse livrinho conseguiu dar um panorama geral sem ser chato. Sobre La La Land, ainda não assisti, mas já vi que ele divide opiniões. Você gostou?

  • FERNANDA SANTOS DOURADO March 20, 2017 at 9:17 pm

    Eu amei! Achei q vc pudesse gostar, pq tem um link com Just Kids